O PÁSSARO DE PRATA

Eu atirei a primeira pedra. Estava escrito. Devia atirar-se pedras.
O monstro esperneou, horrivelmente. Eram horríveis as suas dez pernas. Mais horríveis ainda eram os seus olhos. Quatro em vez de três.
Todos à minha volta atiravam pedras. Do corpo da criatura começaram a jorrar fios de líquido amarelo esverdeado. Era o seu sangue. Sangue amarelo em vez de simples sangue castanho. Senti as minhas entranhas a rodopiar e atirei pedras mais furiosamente.
O monstro parou de espernear. Estava morto.
Os meus irmãos levaram-no. Eu fiquei ali, comtemplando o grande pássaro de prata que o trouxera do céu.
Eu tinha atirado a primeira pedra. Afinal, o grande pássaro pertencia-me. Havia nele uma abertura por onde tinha saído o monstro. A abertura continuava aberta, certamente esperando que o novo dono entrasse.
Entrei, com as minhas quatro pernas a tremer. Entrei e, atrás de mim, o pássaro fechou-se. Ouvi-o sibilar enquanto se fechava e não contive um pequeno grito histérico.
Recuperei depressa a calma. Aquilo que se fechara parecia-me uma porta e, toda a gente sabe, uma porta comanda-se premindo um botão. Pelo menos era assim na minha casa.
Encontrei afinal um botão e premi-o. Foi então que ouvi a voz do grande pássaro de prata:
- Ordem recebida. Vou levar-te a casa.
Afinal o pássaro de prata era bonzinho. Ia levar-me a casa, antes de me deixar sair. Que mais queria eu?
Não consigo explicar a sensação agradável que senti quando o pássaro voou, comigo dentro. Primeiro um peso interior, depois uma leveza de sonho.
Não durou muito tempo, a viagem. Metade do tempo que eu demoraria se fosse a pé.
O pássaro tinha pousado e eu esperava, impacientemente por ver a minha aldeia; as casas cúbicas amarelas, todas dispostas numa geometria quadriculada. A casa mais próxima deveria ser a minha.
Finalmente, o pássaro sibilou.
Descobri nesse instante que o grande pássaro prateado me tinha traído. Lá fora não estava a minha aldeia. Lá fora, o ar era suavemente rosado e três monstros esperavam-me. Monstros horríveis, com dez pernas e quatro olhos cada um. Avaçaram para o pássaro de prata.
Tentei fugir. Saltei para o chão e comecei a correr, mas estavam lá mais monstros. Num deles vi brilhar os quatro olhos, um por um. Foi ele que atirou a primeira pedra.

Pedro Águas, in " O Oásis: e outros contos de ficção científica"

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