A ternura dos 50

   "Muitos deles passaram a sua juventude fazendo jus ao lema «vive depressa, morre jovem e faz um belo cadáver», frase do livro On the road que tornou célebre Jack Kerouac.
   Já que muitos deles viveram depressa, ao ritmo do sexo, das drogas e do rock and rol, ganharam dinheiro a tal velocidade que, uma vez que as coisas corriam bem, acabaram por decidir não morrer.
   Com a passagem dos anos, aqueles heróis do pop acumularam discos, cabelos brancos, mulheres e manadas de netos, que, por vezes, os fazem encontrar-se não nos estúdios de gravação, mas nas escolas e nos jardins infantis.
   A Bob Dylan os 54 anos não lhe pesam porque «já era velho quando tinha 20». Embora chegando até aqui, os anos ensinaram-lhe a saborear a vida.
   Joe Cocker, outro dos sócios do clube dos cinquentões, partilha desta opinião: «Passei metade da vida a nadar em álcool. hoje já não sou escravo dos meus vícios e quando me olho ao espelho acho que estou impecável».
   Lou Reed, outro equilibrista do fio da navalha que já ultrapassou o meio século, não fica atrás de Cocker: «Rio-me dos jovens e do seu desejo de tocar o proibido. Agora sou mais velho mas também mais sábio».
   Em 1965, o grupo The Who cantava na inolvidável My Generation: «Espero morrer antes de chegar a velho». Só o baterista Keith Moon tomou o pé à letra.
   Para Mick Jagger «ser avô é um orgulho e a prova de que fiz bem em não morrer aos 30 anos. Estou melhor do que nunca e espero continuar em cena ainda por muito tempo».
   Neste clube de cinquentões pop há ir e voltar, como nas campanhas de segurança nas praias e no toureio. As grandes figuras dos anos 60 e 70, como Paul McCartney, George Harrison, Tina Turner, Eric Clapton, etc., vivem um contínuo regresso e alguns deles são ainda capazes de fazer tournées gigantescas e verdadeiros concertos-maratona sem sofrerem os desmaios que dantes provocavam no seu público juvenil. Afinal, o tempo acabou por demonstrar que aqueles ritmos e aqueles versos não eram tão satânicos como pareciam e, com o passar dos anos, o veneno transformou-se numa inofensiva ternura dos 50. Coisas do diabo..."
 
Joaquim Letria, in "Livro de assentos"

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