TEMPO DE POESIA

   "Num país de poetas que não lê os poetas, tentar pôr ao alcance de um largo público pequenas antologias das obras poéticas mais significativas poderá parecer empreendimento de todo em todo insensato e destinado a não alimentar senão as veleidades de intervenção cultural de quem o tomar a seu cargo. «Aprisionada» em revistas de escassa tiragem ou em efémeras páginas literárias, «amarelecidas», sob a forma de livro, nas estantes menos à mão das livrarias, não passará, afinal, a poesia de um absurdo vício, de um roer-as-unhas, de um falar-só tão sem destino como o monologar dos tolinhos? Assim é, infelizmente, aqui e agora, na vergonhosa maioria dos casos. Vacuidade camuflada com palavras, estupidificante «diálogo» com absolutos-de-algibeira, alpista de «mistérios» que desprendem bafio, reaccionaríssimo testemunho de um «amor» que se deseja eterno só para melhor «eternizar» a sujeição da mulher, em que interessar-nos esse como que monótono zunido que é o sinal sonoro da poesia portuguesa de hoje? Porém, o nosso propósito não é o de virmos aqui polemizar, mas tão-só o de, ao apresentarmos Tempo de Poesia, deixarmos claramente dito que se alguma veleidade alimentamos é precisamente a de ajudarmos o grande público a «recuperar» a poesia através do que de mais autêntico, moderno e humano se criou e é criado sob o seu signo."
 
Alexandre O'Neill, in "Já cá não está quem falou"

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