"Os muros fazem os ladrões. A Velha Esperança ensinou-me isto - sem jamais ter lido Bakunine -, na mesma tarde em que me contou a autêntica história do soba Mutu-ya-Kevela. Ensinou-me muitas outras pequenas verdades, tão expostas, tão evidentes, que quase ninguém as vê. «Este país», disse-me, «é como um embondeiro: tem as raízes para o céu e as folhas debaixo do chão». Dava exemplos: «Queres ver como está tudo trocado? Os brancos chamam-se Pepetela, Ndunduma, Chassanha. Os pretos chamam-se Agostinho Neto, José Eduardo dos Santos, Mendes de Carvalho, Jorge Valentim». São coisas de que me lembro às vezes, com um sorriso, quando é suposto não ter de me lembrar de nada. Lembro-me dela, outra vez, agora que é demasiado tarde. Soube há pouco que a velha Esperança morreu em Luanda, sentada na mesma cadeira de verga onde eu costumava encontra-la, possivelmente diante do mesmo crepúsculo profundo e irremediável. Ela achava que não morreria nunca. Foi e...